domingo, 10 de janeiro de 2016

“Dar nome aos bois”, para depois...


Se o encontro terapêutico me faz engendrar como cartógrafa um campo afetivo e, em dado momento, paciente e eu compartilhamos nuances caóticas de determinadas experiências, eu, afetada diretamente por essas nuances, e percebendo os excessos e transbordamentos gerando paralisias e atolamentos, deparo-me com o imperativo de “dar nome aos bois” que se apresentam, bois de vários tipos, tamanhos e texturas, que, emaranhados e enredados, não se veem bois, e estão a tecer uma teia grudenta.

Com o corpo implicado, portando voz cuidadosa e fluida, guiada por micropercepções trançadas em formas claras, ir esboçando (com lápis preto, nunca com caneta) algum contorno e produzindo alguma qualidade de contensão, que se fará não para cristalizar quadros e muito menos interpretar o vivido, mas para descongestionar, desobstruir as passagens, e permitir que novas multiplicidades as preencham. Usar um tipo especial de sensibilidade para fechar e abrir com o mesmo movimento, solapando as chances de lançamento de uma encorpada angústia num código meramente classificatório e categorizante, que seria gerador de alívio, mas não de abertura para as múltiplas saídas a serem percebidas e/ou produzidas.

Agindo como uma ponta de agulha quente que facilita o vazamento da ferida purulenta, mas não para cicatriza-la o mais rápido possível e sim para que possa realmente vazar.

“Dar nome aos bois” para depois... Conectá-los às zonas de intensidade da manada.


(Juliana Felipe)

     

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