quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Espaço terapêutico: um lugar para produção de vida potente?

O que viria a ser uma vida potente?


A resposta é quase um trocadilho em relação à pergunta: uma vida potente é um vir-a-ser; é um devir; é a criação de mundos e de modos de existência que estejam conectados com a nossa natureza. E essa criação ou invenção tem no espaço clínico e no encontro terapêutico, múltiplas possibilidades de intensificação.
 
O espaço terapêutico como dispositivo para a produção de relações mais potentes é espaço de implicação afetiva, de desejo, e sobretudo, da efetuação do encontro de utopias pessoais concretas (que não são utopias que preparam um levante, um plano ou torcem/aguardam pela reformulação das psicologias, mas sim ao modo de um barco em processo de invenção que é colocado em curso enquanto se autofabrica, pleno de um mundo de ‘impossibilidades’ que se convertem em ações afirmativas e criadoras) com as múltiplas saídas que os enfrentamentos cotidianos nos colocam. O mote desse espaço é a experimentação e a mobilização de uma maior conexão com as forças que nos constituem.
 
Uma vida potente não se faz sozinha, ela se faz nas relações, nos encontros, nos contágios, via pensamento e ação, seguindo fluxos que permitem a transmutação de estados que nos fazem paralisar, moralizar, aprisionar e enfraquecer a vida.
 
Esta experimentação estimulada no encontro terapêutico deve costurar-se de modo a evitar a queda em ciladas discursivas, que colocam as questões mais relevantes da existência em termos polarizados, binarizados, fragmentados e, portanto, fracos.
 
Desta experimentação nasce uma produção essencialmente ética, estética e política, que busca não a harmonia que esconde ou abafa nossas forças e potencialidades, mas a harmonia de nosso corpo e pensamento com a Natureza e as múltiplas linhas que se conectam a partir desse movimento, utilizando os conhecimentos disponíveis, a arte e os encontros para traçar novos territórios que afirmem a diferença e que se beneficiem dela, o que em si já se revela como algo inevitável, uma vez que produzir vida é amar a diferença, a própria transmutação e a dos outros.

Produzir uma vida potente tem a ver com um estranhamento contínuo consigo mesmo e com o mundo, que nos lança na invenção de relações que afirmem nossa singularidade e a dispensabilidade do nosso apego a identidades duras, que tendem a nos assegurar e preservar. É uma abertura para a vida intensa. Pois se há caminhos, a vida potente indica que os testemos e experimentemos, e, se eles ainda não existem, é porque clamam por invenção.


(Juliana Felipe)