O que viria a ser
uma vida potente?
A resposta é quase um trocadilho em
relação à pergunta: uma vida potente é um vir-a-ser; é um devir; é a criação de
mundos e de modos de existência que estejam conectados com a nossa natureza. E essa
criação ou invenção tem no espaço clínico e no encontro terapêutico, múltiplas possibilidades
de intensificação.
O espaço terapêutico como dispositivo
para a produção de relações mais potentes é espaço de implicação afetiva, de desejo,
e sobretudo, da efetuação do encontro de utopias pessoais concretas (que não são
utopias que preparam um levante, um plano ou torcem/aguardam pela reformulação
das psicologias, mas sim ao modo de um barco em processo de invenção que é
colocado em curso enquanto se autofabrica, pleno de um mundo de
‘impossibilidades’ que se convertem em ações afirmativas e criadoras) com as
múltiplas saídas que os enfrentamentos cotidianos nos colocam. O mote desse
espaço é a experimentação e a mobilização de uma maior conexão com as forças
que nos constituem.
Uma
vida potente não se faz sozinha, ela se faz nas relações, nos encontros, nos
contágios, via pensamento e ação, seguindo fluxos que permitem a transmutação
de estados que nos fazem paralisar, moralizar, aprisionar e enfraquecer a vida.
Esta experimentação estimulada no
encontro terapêutico deve costurar-se de modo a evitar a queda em ciladas
discursivas, que colocam as questões mais relevantes da existência em termos
polarizados, binarizados, fragmentados e, portanto, fracos.
Desta experimentação nasce uma
produção essencialmente ética, estética e política, que busca não a harmonia
que esconde ou abafa nossas forças e potencialidades, mas a harmonia de nosso
corpo e pensamento com a Natureza e as múltiplas linhas que se conectam a
partir desse movimento, utilizando os conhecimentos disponíveis, a arte e os
encontros para traçar novos territórios que afirmem a diferença e que se
beneficiem dela, o que em si já se revela como algo inevitável, uma vez que produzir
vida é amar a diferença, a própria transmutação e a dos outros.
Produzir
uma vida potente tem a ver com um estranhamento contínuo consigo mesmo e com o
mundo, que nos lança na invenção de relações que afirmem nossa singularidade e
a dispensabilidade do nosso apego a identidades duras, que tendem a nos
assegurar e preservar. É uma abertura para a vida intensa. Pois se há caminhos,
a vida potente indica que os testemos e experimentemos, e, se eles ainda não
existem, é porque clamam por invenção.
(Juliana Felipe)
(Juliana Felipe)